Senador Demóstenes Torres tem mandato cassado
"Uma melancólica sensação de dever cumprido. Não tivemos alternativa. Os fatos foram mais fortes do que os argumentos. Entre preservar um colega e preservar a instituição, a alternativa superior foi a preservação da instituição. O Senado não se comprometeu. Pelo menos nesta feita, ele não pode ser achincalhado como tem sido em muitas ocasiões"
Demóstenes depõe no Conselho (Ueslei Marcelino/Reuters) |
Foi assim que o Senador Álvaro Dias definiu o fim da votação que decidiu pela cassação do mandato de Demóstenes Torres pela quebra do decoro parlamentar. O dever neste caso jamais poderá ser confundido com a obrigação. Enquanto a obrigação não nos deixe alternativa possível, no cumprimento do dever sempre se poderá escolher o que fazer em virtude dos interesses envolvidos e dos direitos que se pretendam assegurar por decorrência da atenção dada ao dever em questão. Isso fica claro nos 19 votos contra a cassação e as 5 abstenções das quais apenas uma seria justificável. Isso significa que 19 Senadores da República acataram o argumento da defesa de Demóstenes de que "mentir na tribuna do Senado não quebra o decoro parlamentar" e que pelo menos 4 deles ficaram em dúvida se afinal o decoro quebra ou não quebra.
Tecnicamente a cassação liberaria os órgãos do executivo em ação conjunta com o judiciário para continuar as investigações que dão conta de que o agora ex-senador teria envolvimento nos negócios escusos dos quais é acusado o contraventor Carlos Cachoeira, uma vez que Demóstenes não gozaria mais da imunidade parlamentar que limita a ação dos órgãos públicos. O que poucos sabem é que, mesmo depois de ter o mandato cassado, Demóstenes ainda tem direito ao foro privilegiado como promotor de justiça em Goiás, função à qual voltou a exercer imediatamente após a cassação. O foro privilegiado estabelece que autoridades que prestem serviços relevantes ao Estado não são passíveis de ações penais nos juízos de primeira instância. Somente os tribunais superiores estariam autorizados a julgar seus méritos.
Na prática a cassação não altera em nada a situação do cidadão Demóstenes Torres. Primeiro porque ainda não seria qualquer um que poderia meter-lhe os dedos nas supostas feridas que porventura se escondam por baixo de seu alinhado terno. Em segundo lugar, ainda que a sessão do Senado Federal tenha julgado o envolvimento de um Senador da República com um reconhecido contraventor causa para considerar a quebra do resistente decoro parlamentar, contra o então Senador Demóstenes pesou apenas a acusação de ter recebido de presente de Cachoeira um telefone com a conta paga. E nós sabemos que ganhar presentes não é crime no Brasil.
Para nós fica o alívio ao nos darmos conta de que o quase invulnerável decoro parlamentar, que parecia tão flexível ao ponto de envergar-se sob o peso dos esforços das autoridades sem no entanto jamais se ver quebrado, exceto pela proeza de um único senador em toda a história do Senado Brasileiro, já não é mais tão resistente assim. Mas a expectativa de ver o decoro ser quebrado por duas vezes consecutivas ficou só na vontade.
O conselho da Câmara dos deputados decidiu arquivar o pedido abertura de inquérito contra o Deputado Federal Protógenes Queiroz, acusado também de manter relações com outro envolvido nos negócios de Carlos Cachoeira. Pelo visto as relações de fraterna amizade entre as autoridades e os suspeitos de envolvimento em atividades criminosas não seriam suficientes para quebrar o virtualmente inquebrantável decoro parlamentar, a não ser que sejam incautas o bastante para se deixar flagrar recebendo presentinhos destes amigos singulares.
Bem feito para mim e para você que por questões morais, éticas e de consciência, passando pelo âmbito de nossa educação familiar, indo muito além da simples interpretação distorcida da lei, nos recusamos a ter no rol de nossas amizades pessoas que aparentemente desprezam o valor destas mesmas leis que agora usam indevida e descaradamente para se livrar de quaisquer acusações.
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